sexta-feira, 17 de julho de 2009

Velhos guerreiros adormecidos




Temos dentro de nós velhos guerreiros adormecidos.
Espíritos de velhos guerreiros de rosto duro e marcado, cheios de cicatrizes e sabedoria. De armaduras pesadas e gastas de batalhas que já perderam a conta. São calmos e serenos. Não gostam de ser incomodados com questões menores e não lutam nem aparecem quando queremos. São velhos guerreiros que estão a descansar de longas batalhas. Não querem lutar mais.

Muitas vezes estão adormecidos há tanto tempo que não sabemos como os evocar. Muitas vezes. Mas eles estão lá.

E quando os evocamos no momento certo para as causas certas, aparecem. Às vezes e só às vezes acordam e aparecem quando é preciso. Sem os chamarmos e quando menos esperamos.

Mas quando aparecem, meus caros. Quando aparecem somos invencíveis. Segredam-nos palavras silenciosas de sabedoria, apoiam a mão no nosso ombro, sossegam-nos e dizem: Segue em frente. Não tenhas medo. Nós estamos aqui.

Aí, nem os demónios nem os fantasmas que habitam dentro de nós têm coragem de os e nos enfrentar. Ao som dos tambores de guerra que anunciam a chegada dos velhos guerreiros, refugiam-se covardemente nos recantos mais recondidos de nós e esperam em segurança que eles voltem a adormecer.

E aí, sem demónios nem fantasmas a enfraquecer-nos, meus caros, somos donos do mundo. Crescemos perante os outros e nada, mas mesmo nada, tem coragem de nos fazer frente. Porque os nosso olhar e postura é sem medo. É um olhar e postura pacífico mas disposto a qualquer luta se for necessário. Sem medo de nada. Afinal de contas são velhos guerreiros. Não têm medo de morrer.
Mostram-se e preferem não ter que desembainhar as espadas. Preferem mostrar que a luta não vale a pena.

Como velhos guerreiros sábios que são nunca se confrontam com os velhos guerreiros que habitam dentro de outras pessoas.. Afinal de contas nenhum velho guerreiro luta por prazer. E como são sábios, sabem que os confrontos são basicamente estúpidos e desnecessários.

Desembainhar a espada e retesar os arcos só para golpes certeiros e tiros mortais. A partir do momento em que a lâmina da espada fica à vista, só volta a recolher-se depois de saciada numa orgia e festim de sangue.
É melhor que não saia. Os sábios sabem disso.









Gosto quando eles aparecem, os velhos guerreiros. Sinto-me protegido.
Até porque a maioria das batalhas não são com os outros. São com os nossos próprios demónios e fantasmas.

Às vezes chego a esquecer-me que eles existem.

M.

Fotos do filme "os sete samurais" de Akira Kurosawa e ilustração daqui.